Antigo blogue do projeto novasoportunidades@biblioteca.esjs

Antigo blogue do projeto novasoportunidades@biblioteca.esjs, patrocinado pela Fundação Calouste Gulbenkian
Escola Secundária José Saramago - Mafra

terça-feira, 30 de abril de 2013

FÁBULA

Olival
Imagem daqui.
 
 
 
"As árvores na protecção dos deuses
 
A árvore deve ser estimada pelo fruto e não pelas folhas

Os deuses escolheram um dia as árvores que queriam que estivessem sob a sua protecção. O carvalho agradou a Júpiter, mas a murta agradou a Vénus; o loureiro a Febo; o pinheiro, a Cibele, e o elevado choupo, a Hércules. Minerva, admirando-se, perguntou-lhes porque escolhiam árvores estéreis. Júpiter disse como causa: Para que não pareçamos vender a honra pelo fruto. Mas, por Hércules, alguém dirá o que quiser - disse Minerva - a oliveira é-nos mais agradável por causa do fruto. Então o pai dos deuses e criador dos homens assim disse: Ó filha, com razão tu és chamada sábia por todos. Se não é útil aquilo que fazemos, é vã a glória. A fabulazinha aconselha a não fazer nada que não seja útil."

Fedro, Fábulas, versão portuguesa de Nicolau Firmino, Lisboa, Editorial Inquérito, 1990, p.72.
 
 

segunda-feira, 29 de abril de 2013

DA CONCISÃO XX

Retrato de Nietzsche, por Munch (1906)
Imagem daqui.
 
 
 "Por maior que seja a avidez do meu conhecimento, não posso retirar das coisas mais do que aquilo que me pertence já; o que é dos outros, continua nelas."

Frederico Nietzsche, A Gaia Ciência, Lisboa, Guimarães & Cª Editores, 1977, p.173.
 
 

SEM PALAVRAS IX

Ennio Morricone, banda sonora do filme Cinema Paraíso (Giuseppe Tornatore, 1988)
 
 

sexta-feira, 26 de abril de 2013

FLOR QUE NÃO DURA

Fotografia do Professor Martinho Rangel


Flor que não dura
Mais do que a sombra dum momento

Tua frescura
Persiste no meu pensamento.

Não te perdi
No que sou eu,
Só nunca mais, ó flor, te vi
Onde não sou senão a terra e o céu.
Fernando Pessoa (1924)

PORTAS QUE ABRIL ABRIU

Cartaz de Vieira da Silva
 
 
As portas que abril abriu é o nome de um ciclo de conferências cujo objetivo é abordar os processos de transformação no período pós-25 de abril.
 
 
Dias 30 de abril, 14, 21 e 28 de maio, às 18h30
Biblioteca-Museu República e Resistência (Espaço Grandella), em Lisboa
 
Todas as informações poderão ser consultadas aqui.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

25 DE ABRIL

Jorge de Sena (Lisboa, 1919 - Santa Bárbara, Califórnia, 1978)
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Discurso pronunciado por Jorge de Sena, na Catânia, Sicília, no momento de receber o Prémio Internacional de Poesia Etna-Taormina, no dia 25 de abril de 1977.

“DISCURSO DO XV PRÉMIO INTERNACIONAL DE POESIA ETNA-TAORMINA

(…) A liberdade que voltou a Portugal é algo pela qual sempre lutei, à qual sacrifiquei muito da minha vida inteira, e a essa luta pertence grande parte da minha poesia. E é outra razão especialíssima para um escritor português antifascista receber com emoção este Prémio, sobretudo se este escritor sempre contou a Itália entre as suas pátrias do espírito, como é o meu caso. Hoje, 25 de Abril, é o aniversário da definitiva queda do Fascismo italiano há décadas, mas é também o aniversário da queda recente do fascismo português. Neste momento permitam-me que faça votos para que nem um nem outro jamais voltem a dominar povos nobres como os nossos, sempre traídos por classes dirigentes menos nobres que eles. (…)
E assim, num dia tão significativo, nesta Sicília simbólica de quanto o Ocidente produziu e fundiu de civilização, aqui tendes este português com mais de uma pátria e que, assim sendo, deixem-me informar-vos, representa realmente Portugal. O meu país sempre, desde que começou há mais de oito séculos, exportou mais homens do que outra coisa. E sempre foi para os seus filhos uma pátria ingrata, sem que esses filhos deixassem de amá-la profundamente.
A minha poesia nada tem de patriótica ou de nacionalista, e eu sempre me quis e me fiz um cidadão do mundo, no tempo e no espaço. É uma poesia que sabe de tudo e que se escreveu em toda a parte, desde a épica de Gilgamesh, até à falta de comunicação com que os poetas mais jovens de hoje fingem que não estão calados. É também a poesia de um homem que viveu muito, sofreu muito, partilhou a vida pelo mundo adiante, sempre exilado, e sempre presente com uma vontade de ferro. Mas é uma poesia que, sempre que se forma, não sabe nada, porque é precisamente a busca ansiosa e desesperada de um sentido que não há, se não formos nós mesmos a criá-lo e a fazê-lo. (…)
Senhoras e Senhores. Recebo este prémio com uma emoção infinita, cujas múltiplas razões já acentuei. Recebo-o humildemente, creiam, menos por mim do que representando uma literatura velha de novecentos anos, desde os seus fragmentos mais antigos. E, mais do que isso, uma literatura latina, filha directa, como a vossa, na língua e na tradição, daquele mundo greco-latino de que esta terra da Sicília foi pátria de eleição, e uma literatura-mãe de outras literaturas tão pujantes e grandes como a brasileira, e tão prometedoras como as africanas que despontam. Helenicamente, romanamente, ou portuguesmente, nós e vós descobrimos e dominámos o mundo. Agora, estamos, Itália e Portugal, na lista dos países velhos cujas contas os outros examinam, para emprestar-nos dinheiro, e cuja ordem e progresso possíveis há quem deseje destruir. Mas a velhice tem suas vantagens: uma cínica e inocente sabedoria que nos salva à última hora, e uma consciência tranquila de que a morte, se vier, não nos mata. Porque aquilo que somos em cultura não pode morrer. (…)
Uma palavra mais: em nome do ainda mais que me liga a vós. Eu nasci em Lisboa, lendariamente fundada por Odysseus numa das suas viagens que Homero se esqueceu de contar ao dizer das andanças dele nestes mares. E, como descendente de lusitanos, descendo do lendário Lusus, e sou portanto neto do próprio Diónisos. Sou, portanto, de nascença, e divinamente, um cidadão da Magna Grécia que apenas necessitava desta consagração para reassumir a sua plena nacionalidade: Etna-Taormina.
À Sicília, à Itália, ao digníssimo júri, ao meu tradutor italiano, a todos vós, muito obrigado, por mim e por Portugal.
Taormina, 23 de Abril de 1977”

A Arte de Jorge de Sena, edição de Jorge Fazenda Lourenço, Lisboa, Relógio D’Água Editores, 2004, pp.369-373.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

EM ABRIL, LIVROS MIL

Multimédia: Marcelo Almeida, 12.º S3

Seleção de títulos existentes na BE para ler no mês do livro e da liberdade.  

QUINTO IMPÉRIO: A LUSOFONIA

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"De modo ambíguo, alguns como Vieira ou Fernando Pessoa sonharam com um Quinto Império Luso, mas isso pertence ao passado, e para a Lusofonia ninguém o defende no presente, até porque, como dizia ironicamente Agostinho da Silva, já não há lugar para um Quinto Império porque já ninguém pretende ser «quintimperador».
 
Lusofonia é, pois, na evolução civilizacional e das ideias, o novo nome do transformado Quinto Império."

 
 
Fernando Cristóvão, "Jorge Amado e a construção da Lusofonia", conferência proferida em 11 de abril de 2013, na Academia das Ciências de Lisboa. O texto integral poderá ser lido em http://www.ciberduvidas.com/textos/lusofonias/14002
 
 

segunda-feira, 22 de abril de 2013

O LIVRO E O QUE ELE RETRATA

Os doze profetas, obra do Aleijadinho.
Igreja do Bom Jesus de Matosinhos, Congonhas do Campo, Minas Gerais, Brasil
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“Isaías, Jeremias, Baruc, Ezequiel, Daniel, Oséias, Jonas, Joel, Amós, Nahum, Abdias, Habacuc: meus doze amigos e sombrios profetas ficaram para trás; da minha janela, nesta casa de Mateus, vejo o vale, suas trilhas, as lavouras, os pastos e a floresta, a Pedra do Papagaio. Já estou aqui há muitas semanas; o inverno transforma-se em primavera cálida e florida; na janela há uma planta colorida, a buganvília, e o dia todo beija-flores de tons metálicos vêm visitá-la: param no ar, vibrando as asas como besouros, e bebem o néctar doce. É curioso que este lugar, escolhido por Mateus, tenha sido visitado há oitenta anos por Saint’Hilaire e que ele tenha descrito o vale e as montanhas com tantos detalhes. Foi como uma premonição para mim.

*

Antes de nossa viagem para o Brasil, naqueles dias em que visitamos Firmiano em Digne, na Provence, ele havia falado muito das viagens de seu mestre; nos mostrara os livros editados na França e nos dera uma coleção deles para nos ajudar em nossa busca. Eu os lera antes mesmo de partirmos; mas eram tantas as informações, que registrei apenas o essencial: os guarani, os botocudos, o Rio de Janeiro – informações de viagem. Além disso, o impacto da realidade, desde que havíamos aportado em Salvador, sobrepujara o conteúdo de qualquer texto; havia muito o que aprender no dia a dia. Seus livros continuam comigo, como continuam as obras de Gonçalves Dias. Outro dia, voltando de um passeio pelo sopé da grande pedra, Mateus mostrou-me uma flor complexa, com profunda coloração lilás e sabor de hortelã; mas não sabia seu nome. Ao retornar, busquei os livros de Saint’Hilaire para ver se ele a havia registrado. Foi então que, surpreso, descobri que ele havia citado não apenas essa flor, mas que fizera uma descrição primorosa de todo o vale, da serra, das pedras, e até mesmo da gente que habita por aqui; Mateus escolhera o lugar certo para viver.”
Murilo Carvalho, O Rastro do Jaguar, Alfragide, Leya, 2009, pp.236-237.
 

ROMEU E JULIETA, de Franco Zeffirelli

 

Romeo & Juliet


Filme de Franco Zeffirelli (1968)

Sábado, 11 de maio de 2013, às 11h00          

no Grande Auditório da Fundação Calouste

Gulbenkian, em Lisboa

 

sexta-feira, 19 de abril de 2013

AQUISIÇÕES RECENTES



História de Portugal, José Hermano Saraiva. Coleção de seis volumes:

Vol. 1 - Origens. O Nascimento de Portugal. Resumo genealógico.
Vol. 2 - Progressos e conflitos sociais. A solução atlântica. Monopólio oriental.
Vol. 3 - Domínio filipino e Restauração. Monarquia absoluta. O Marquês de Pombal. O crepúsculo do velho regime.
Vol .4 - As Invasões Francesas. 1820: A revolução prematura. O vintismo. A contra-revolução.
Vol. 5 - Cartismo e setembrismo. A monarquia burguesa. O Império Colonial. O fim da monarquia.
Vol. 6 - A República. Cronologia da História de Portugal.

 Oferta da revista Sábado.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

CIDADE DOS LIVROS


Por ocasião do Dia Mundial do Livro, a Câmara Municipal de Torres Vedras promove o evento Torres Vedras: Cidade dos Livros, entre os dias 18 e 23 de abril de 2013. 
 
 

quarta-feira, 17 de abril de 2013

NA ORIGEM DO ATO CRIADOR


Alcaparreira em flor.
Imagem daqui.
 
 
 
“Foi através da língua portuguesa, e no cenário sem par do Alentejo, que me procurei e me descobri e, muito jovem, ainda adolescente, nasci escritor. Nos meus primeiros exercícios da palavra, que eram necessariamente milimétricos, em boa parte, havia já cinquenta por cento, ou mais, de vontade cognitiva, e o resto de exercício lúdico. Curiosamente, duas linhas quase opostas começavam a desenhar-se nesses meus primeiros textos ingénuos: a do encantamento perante a vida e a natureza e a da revolta ou, para ser mais exacto, da indignação face à injustiça que me rodeava.

Ao longo da existência fui conquistando outras línguas, que me deram acesso a outras culturas e a outros esquemas mentais. Mas só no universo sonoro da língua portuguesa a minha pena se movia, se comovia. Vocábulos como Sol, encarnado, Irisalva, almocreve, alcaparra ou alguidar enchiam de luz os meus ouvidos, particularmente sensíveis à faculdade onomatopaica de certas palavras. Desde muito cedo, ainda criança, me dei conta de que o pensamento só pode ser apreendido na língua, embora esta, como continente, não se possa sequer imaginar sem o seu conteúdo, a ideia das coisas. Veículo e estímulo do pensamento, matriz do meu estar no mundo, do meu modo de o entender.

A língua, evidentemente, é de todos, embora pertença mais a uns do que a outros, consoante o grau de conhecimento do real que nela, e por ela, lograram adquirir. Mesmo entre os escritores há grandes variações, desde a concisão e a austeridade lexical desse realismo da subjectividade em que Stendhal foi mestre à riqueza conotativa do mundo verbal flaubertiano. Nas literaturas de língua portuguesa, as que de momento nos importam, é ainda maior a distância entre o caudal vocabular e sintáctico dos grandes clássicos, à excepção de Camões, que rompeu a barreira de vários códigos limitativos, e as línguas de autor, prodigiosamente amplas e fecundas, de um Aquilino Ribeiro, de um Guimarães Rosa, de um Luandino Vieira.

O amor à língua, à língua mãe, instrumento de ofício, escada para o paraíso e para os infernos, passa não só pelo culto do rigor, da precisão, mas ainda pela violência apaixonada com que poetas e prosadores a subvertem e a transformam. É o povo, decerto, quem faz a língua, quem a vai, dia a dia, empurrando para o futuro, mas o escritor deixa nela as suas marcas, participa na sua viagem, nos seus acidentes, cria-lhe ele próprio meandros, contornos. É o trabalho exercido sobre a língua que dá ao texto a transparência que o abre à comunicação ou a opacidade que lhe confere o mistério, o poder encantatório.”
Urbano Tavares Rodrigues, A Natureza do Acto Criador, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2011, pp.9-11.
 

terça-feira, 16 de abril de 2013

A CRIANÇA, O MUNDO, A VIDA




 


SENSIBILIZAÇÃO DO ESPAÇO URBANO E RURAL À CRIANÇA


š A criança sabe muita coisa. E gosta de contar, de fazer, de ajudar. Crescer é também sentir que nos ouvem e nos aceitam a fazer aquilo de que somos capazes. (…)


š Quando uma criança lhe falar, dê-lhe atenção. Ela descobre o mundo com a sua ajuda. Ninguém gosta de ser ignorado, muito menos uma criança.


š Fazer um brinquedo de madeira ou de cana com os seus filhos é plantar o sonho e a amizade no coração das crianças e povoar este País de plantas, papagaios e tantos outros testemunhos do que de melhor existe em nós.


š A rua tem de servir para brincar. Transformá-la num lugar de descoberta seguro e agradável para as crianças depende, em parte, da nossa força de vontade.


š Os caminhos e veredas foram feitos para aproximar as pessoas. Passear com um grupo de crianças, parar numa sombra, pescar e merendar são actividades fáceis de realizar (…).


š Correr, saltar, trepar é para as crianças tão necessário como terem de comer e serem amadas. Os locais bonitos, com árvores, terra e água têm de existir nos sítios onde vivemos. Lutar por eles é garantir uma infância mais feliz.

 
š Em cada rua, casa ou bairro há sempre lugar para uma flor, uma árvore, um canteiro. Cuidar de plantas com as crianças é um belo exercício de amor.


š Ter uma casa aberta em cada bairro e aldeia com livros, pincéis e tintas, brinquedos e alguém disponível para receber as crianças, é meio caminho andado para todos, incluindo os adultos, terem outro brilho no olhar.

 
š Viver com os outros não se ensina. (…) São os actos, mais do que as palavras, que transformam o mundo.
 
Domingos Morais, “A criança e os tempos livre”, Cais, #181, março 2013, p. 9.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

SEMANA DA LEITURA 2013 (4)

O MAR

O mar sempre foi um fascínio para os Homens, principalmente para os portugueses, pois foi o mar que nos revelou o Brasil, foi o mar que nos revelou a Índia e foi pelo mar que surgiu Os Lusíadas.
Se atribuíssemos ao mar um Deus ou uma força divina, não saberia se esta seria benigna ou maligna. Sim, é verdade que o mar deu muitas felicidades a pessoas de todo o mundo, mas também deu muitas tristezas. Utilizando Portugal como exemplo, sinto-me orgulhoso em dizer que sou português e isso deve-se ao facto do mar existir.
Foste tu, mar, que ajudaste o meu povo, quando mais precisávamos. Dizem que somos corajosos, mas foste tu que quiseste que chegássemos ao nosso destino. Nós somos quem somos, hoje, porque tu existes, nós temos uma das obras mais belas de sempre porque tu existes. Mas nem sempre tu foste bom para as pessoas, muitas vidas se perderam na tua imensidão. No fundo, acho que é isso que te torna mais misterioso e mais tenebroso, pois não é qualquer um que se aventura na tua grandiosidade.
És como um livro de contos por acabar, és como uma vela para um escritor, és um assunto para uma obra, és desconhecido para toda a gente, mas és admirado por toda a gente.

Texto da autoria de Henrique Vicente, 10.º N.

DOS LIVROS E DA ESCRITA

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“Os autores podem ser divididos em meteoros, planetas e estrelas fixas. Os primeiros produzem um efeito momentâneo: erguemos o olhar, gritamos: «Olhem!» - e desaparecem para sempre. Os segundos, as estrelas móveis, duram muito mais tempo. Em virtude da sua proximidade, chegam a brilhar mais do que as estrelas fixas, que os ignorantes confundem com elas. Mas também eles têm de largar o seu lugar, brilham apenas com uma luz emprestada, e a sua esfera de influência é limitada aos que viajam com eles (os seus contemporâneos). Só os terceiros são imutáveis, mantêm-se firmes no firmamento, brilham com luz própria e influenciam todas as eras por igual, pois o seu aspecto não se altera quando se altera o nosso ponto de vista, dado que não têm paralaxe. Ao contrário dos outros, não pertencem a um único sistema (nação): pertencem ao Universo. Mas é precisamente por estarem tão alto que a sua luz leva geralmente tantos anos a chegar aos olhos dos habitantes da Terra.”
Arthur Schopenhauer, Aforismos, Mem Martins, Publicações Europa-América, 1998, p.86.


sexta-feira, 12 de abril de 2013

N' EÇA LEITURA

(...) Uma das senhoras de preto fazia votos para que se aliviassem os estudos. As pobres crianças sucumbiam verdadeiramente à quantidade exagerada de matérias, de coisas a decorar: o dela, o Joãozinho, andava tão pálido e tão desfigurado, que ela às vezes tinha vontade de o deixar ignorante de todo. A outra senhora pousou a chávena sobre uma console ao lado, e, passando sobre os lábios a renda do lenço, queixou-se sobretudo dos examinadores. Era um escândalo as exigências, as dificuldades que punham, só para poder deitar RR... Ao pequeno dela tinham feito as perguntas mais estúpidas, as mais reles; assim, por exemplo, o que era o sabão, porque lavava o sabão?...
A outra senhora e a condessa apertavam as mãos contra o peito, consternadas. E Carlos, muito amável, concordou que era uma abominação. O marido dela - continuava a dama de preto - ficara tão desesperado que, encontrando o examinador no Chiado, o ameaçou de lhe dar bengaladas. Uma imprudência, decerto; mas, enfim, o homem fora malvado!... Não havia verdadeiramente senão uma coisa digna de se estudar, eram as línguas. Parecia insensato que se torturasse uma criança com botânica, astronomia, física... Para quê? Coisas inúteis na sociedade. Assim, o pequeno dela, agora, tinha lições de química... Que absurdo! Era o que o pai dizia - para quê, se ele o não queria para boticário?(...)

QUEIRÓS, Eça - Os Maias. Lisboa: Livros do Brasil, s.d. Cap IX, p. 294.

XVI BIENAL DO LIVRO DO RIO DE JANEIRO

Imagem daqui.
 
A XVI Bienal do Livro do Rio de Janeiro decorrerá, este ano, de 29 de agosto a 8 de setembro, sendo a Alemanha o país homenageado.
 
Todas as informações poderão se consultadas aqui.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

UMA PEQUENA PALAVRA

Imagem daqui.



Amor não é abstrato.
Amor são cinco sentidos:
Visão, olfato,
Audição, paladar e tato.


E por ser todos os cinco
Deveria ser considerado um sexto.
Amor, sendo tão alto sentimento
Não se deixa explicar num simples texto.

 
Nem em prosa, nem em estrofes
O consigo deslindar. Amor é das pequenas palavras
Que só as grandes metáforas
Conseguem decifrar.

Poema da autoria de Eduardo Simões, Aluno do 10º G, desta Escola.
 

quarta-feira, 10 de abril de 2013

RETRATO DE VITINHA


Baptista-Bastos (Lisboa, 1934)
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“Entre a malta do meu bairro de menino, o Vitinha ficou sempre no retábulo dos intocáveis. Tinha sobre todos nós a vantagem dos olhos azuis, dos caracóis loiros e do dinheiro aos domingos, para o cinema e os rebuçados. No pátio da Surda, que era o centro do nosso universo, o sítio onde se conspiravam as púrrias, se contavam histórias, se fumavam cigarritos sorrateiros, no pátio da Surda, Vitinha tinha lugar de cabeça. Os pais compravam-lhe revistas com bonecos desenhados, e ele tinha um fato à maruja e boné branco com pom-pom vermelho. Quando vínhamos da escola parávamos por ali: Naftalina, o Descasca-Milho, o Necas Bexiga, o Dá-e-Foge, o Pingado e eu. Eu era o Transparente. Vitinha era o Vitinha. Intocável. Sem alcunha e intocável. Quando os rapazes das outras ruas puxavam os caracóis do Vitinha, logo a malta organizava uma púrria. Quando o Vitinha caiu pelas Escadinhas do Monte e partiu a tola, fomos todos vê-lo a casa. Quando o Vitinha bateu no filho do Zé Caroço demos uma tareia no filho do Zé Caroço. Quando o Vitinha roubou um ananás da porta da mercearia do Meireles, confessei-me culpado.
Feita a quarta classe, os nossos pais decidiram que já sabíamos muito.
Ficámos contentes com a responsabilidade de ser homens e fomos cada qual à nossa vida. Vitinha para o liceu. Uns continuaram no bairro; outros atravessaram a fronteira da rua antiga e foram para ruas novas, descobrindo a cidade. Vitinha cortou os caracóis, mas permaneceu de cabelos loiros e de olhos claros. Namorou a Amélia, que trabalhava na costura com a Dona Maria dos Remédios, e casou com uma rapariga alta da Faculdade. «Parabéns, Vitinha», dissemos todos sorridentes e felizes quando o anjo intocável lá foi com a noiva, num automóvel negro e imenso. Falámos sempre no Vitinha, no decorrer dos anos. Era o único doutor do bairro, e a nossa glória conseguida. Foi presidente de sociedades, discursou em actos onde se proclamavam princípios, lá apareceu nos jornais, cheio de condecorações com o ar grave de quem medita e de quem serve. «O Vitinha. Vejam o Vitinha. Aquilo é que é um homem, um grande homem.» Dizíamos isto uns aos outros, os antigos rapazes do bairro, muito contentes pelo seu destino irretorquível.
Aqui há semanas perdi o emprego, e aqui há dias a minha mulher, a Amélia, disse-me: «Vai ao Vitinha, homem; ele sempre há-de arranjar qualquer coisa.» Bela ideia. À noite disse aos amigos: Amanhã vou ver o Vitinha. Vou falar com ele…
Todos ficaram alegres. «Dá lá recomendações, pá», disse o Naftalina. «Não te esqueças», avisou o Necas Bexiga.
No outro dia, lá fui ao prédio alto.
Disse o meu nome à empregada do consultório, ela desapareceu por uma porta, e voltou quase a seguir: «O sr. dr. pergunta se o seu assunto é urgente, se não pode esperar uns dias.»
Interrompi a empregada: «Olhe, diga ao sr. dr. que está aqui o Transparente.» Era uma invenção súbita, uma sigla que a rapaziada da antiga confraria entendia abertamente. Ela voltou e disse: «Desculpe, mas o sr. dr. manda dizer que não o conhece»…”
Baptista Bastos, “Então que é isso ó Vitinha?!...”, in Contos e Crónicas de Expressão Portuguesa, Paris, Langues pour Tous – Pocket, 2004, pp.28-32.

terça-feira, 9 de abril de 2013

ALMADA NEGREIROS


Autorretrato de José Sobral de Almada Negreiros
(São Tomé e Príncipe, 1893 - Lisboa, 1970)
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Por ocasião da passagem dos 120 anos sobre o nascimento de Almada Negreiros, é hoje inaugurado em Lisboa um programa de comemorações, que decorre até ao fim do ano, incluindo uma exposição inspirada neste artista multifacetado, a um tempo pintor e escritor.

Fonte: Expresso.

 

segunda-feira, 8 de abril de 2013

DA CONCISÃO XIX

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"Já um filósofo disse que os limites do nosso mundo são os limites da nossa linguagem. E é verdade. Apenas esse filósofo se esqueceu de acrescentar que à poesia cabe o papel de superar todos os limites, ampliando-os em extensão e profundidade."

A Arte de Jorge de Sena, edição de Jorge Fazenda Lourenço, Lisboa, Relógio d'Água Editores, 2004, pp.371-372.
 
 

sexta-feira, 5 de abril de 2013

TOP LEITORES (2012-2013)

Com base nos registos de leitura domiciliária, a biblioteca elegeu os leitores do 2.º período:

(Alunos do ensino regular e profissional)

1.º Vitor Vidal, 11.º R2

2.º Maria Carvalho, 10.º N

3.º Miguel Belga, 12.º M


(Adultos)
1.º Ana Reis

2.º Balbina Jantareta

3.º Inácia Lopes

  Parabéns!
 

quinta-feira, 4 de abril de 2013

CICLO VINTE MIL LIVROS - JOSÉ SARAMAGO

Imagem: Museu do Neo-Realismo
José Saramago será o autor em destaque na Exposição que o Museu do Neo-Realismo abre ao público no próximo sábado, dia 06 de abril, a partir das 12h00.
Trata-se de uma mostra integrada no Ciclo Vinte Mil Livros, que visa dar a conhecer o acervo literário do Centro de Documentação do MNR (disponível para consulta nas instalações do Museu), no que se refere à obra de cada um dos autores selecionados, bem como possibilitar um contacto do público com o percurso literário de escritores relevantes no panorama da literatura portuguesa do século XX.
A Exposição estará patente até 27 de outubro do corrente ano, na Livraria do MNR.
A entrada é gratuita.

Fonte: Museu do Neo-Realismo

AQUISIÇÕES RECENTES




ALVIM, Pedro – Os Jogadores de Xadrez. Lisboa: Livros Horizonte. 1986. 36 p.
BORGES, Jorge Luis – O Livro de Areia. Maia: Quetzal Editores. 2012. 134 p. ISBN 978-972-564-993-0
HANNAH, Kristin - Estrada da Noite. Lisboa: Círculo de Leitores. 2012. 399 p. ISBN 978-972-42-4800-4
LETRIA, José Jorge – O Vermelho e o Verde. Lisboa: Planeta. 2010. 147 p. ISBN 978-657-076-7

PEIXOTO, José Luís - Dentro do Segredo: uma viagem na Coreia do Norte. Maia. Quetzal Editores. 2013. 4.ª ed. 236 p. ISBN 978-989-722-060-9

SARAMAGO, José - Memorial do Convento. Alfragide: Caminho. 2012. 52.ª ed. 493 p. ISBN 978-972-21-0026-7
SMITH, Robert Rowland - Pequeno-almoço com Sócrates: a filosofia da vida quotidiana. Alfragide: Lua de Papel. 2010. 218 p. ISBN 978-989-23-0969-9 
SOBEL, Dava - A Filha de Galileu. Maia: Círculo de Leitores. 2012. 2.ª ed. 312 p. ISBN 978-989-644-174-6
SOBEL, Dava - Um Céu Mais Perfeito. Maia: Círculo de Leitores. 2012. 302 p. ISBN 978-989-644-181-4

AO ACASO, Eça de Queirós

Astrolábio
Imagem daqui.



“Ainda ontem eu pensava que nós outros os peninsulares nem sempre tínhamos sido uma nação estreita, de pequenas tendências, sonolenta, chata, fria, burguesa, cheia de espantos e servilidades: e que este velho canto da Terra, cheio de árvores e de sol, tinha sido pátria forte, sã, viva, fecunda, formosa, aventureira, épica!
Ah! Foi há muito tempo.
Era naqueles tempos em que a Itália rodeava os papas severos; e olhavam para o céu as Virgens do Dominiquino. Por esse tempo ia pela Europa uma transformação social. Na Alemanha, Lutero entrava em Worms, com um canto batalhador, em nome do espírito, da alma. O papado ia morrer. (…)
Todo o Sul católico estremeceu: aquela revolta vinha imprevista e rápida: um dia a imperceptível e vasta humanidade, quando fosse uma madrugada para as suas adorações, podia encontrar a velha Roma deserta, e ao longe o Catolicismo dissipando-se com um som hierático de salmos, e um colorido vermelho de fogueiras.
Era necessário salvar o Sul. (…)
Ora durante essa luta das religiões e das pátrias, a Península, encolhida nas suas montanhas, coberta de sol, violenta, sinistro cavaleiro de Deus, armava as caravelas e os galeões para as bandas desconhecidas das ilhas, dos continentes das Índias, dos cabos temerosos. Nós outros, os peninsulares, aparecíamos às outras nações como velhos lobos do mar, sempre em viagem, trigueiros, rijos como calabres, sãos como o sol, ensurdecidos pelo clamor das marés, cheios de legendas, e do cheiro das viagens, sobre os tombadilhos, e perdidos, ao longe, perdidos nas brumas terríveis.
De vez em quando desembarcava este povo, bradando que tinha descoberto um mundo, que lá tinham ficado infinitas multidões, negras, bestiais e nuas sob a bênção dos padres: ali mesmo sobre a areia, ao rumor das maresias, escrevia a história trágica da sua viagem, e uma madrugada, tomados das saudades do mar, partiam de novo, radiosos e bons, para a banda das Índias. (…)
Escreviam-nos entre os assaltos e as tempestades, no convés das caravelas, nos cabos tormentosos, nas florestas sagradas (…) sob as imobilidades cruas da luz: escreviam cobertos das espumas, enegrecidos pelos fumos, trémulos das iras das batalhas. Por isso enchiam as suas crónicas e os seus poemas de uma estranha prodigalidade de força e de vida. (…)
Mas eles também tinham amores, ciúmes, paternidades, paixões, lirismos interiores, e as saudades da pátria nasciam naquelas almas como grandes açucenas que se abrem dentro de um vaso e que o enchem. (…)
Estavam longe da Europa, das plásticas da Itália, dos renascimentos gregos e romanos, das antigas formas rituais, das educações clássicas.
Não conheciam isto.
Mas lembravam-se sempre das cantigas da pátria, das endechas heróicas, dos romances populares, que eles tinham ouvido pelos campos, com que os velhos embalavam, que se cantam à noite às estrelas por Sevilha e por Granada e que os mendigos diziam pelas velhas pontes dos Godos e dos Árabes. Porque o povo na Península tinha uma poesia, sua exclusivamente, que cantava nos trabalhos, com que adormecia os filhos, em que escarnecia os alcaides e celebrava os heróis. (…)
Em Portugal (…) há mais serenidade na força: o carácter português é mais parecido com o carácter italiano: os nossos sábios, os nossos viajantes, os nossos descobridores tinham mais a lucidez do tempo de Dante: as navegações são prudentes: por isso Portugal não resistiu nada à influência italiana. O renascimento da Antiguidade, a serenidade plástica, a frieza clássica aclimatam-se na Espanha mas com dor e com luta: foi necessário que a Espanha já não acreditasse na sua epopeia cavalheiresca e que Cervantes começasse a fazer trotar pelos caminhos o magro D. Quixote.
Em Portugal não: o génio antigo aclimatou-se: transformou-se mesmo: perdeu o elemento vital e fecundo e ficou-lhe o elemento retórico. (…)”
Eça de Queirós, Prosas Bárbaras, Lisboa, Edição Livros do Brasil, s/d, pp.145-152.

 

quarta-feira, 3 de abril de 2013

SUGESTÃO DE LEITURA (33)


Darwin foi um dos primeiros investigadores a consi­derar os benefícios do sexo e fê-lo de modo pragmático, como sempre. Ele entendia que a principal vantagem do sexo era o vigor híbrido, ou seja, que a descendência de dois progenitores não relacionados é mais forte, mais saudável e mais apta — e tem menor probabilidade de sofrer de doenças congénitas como a hemofilia ou a doença de Tay-Sachs — do que os filhos de progenitores familiares próximos entre si. Bastava olhar para as an­tigas monarquias europeias como, por exemplo, os Habsburgos, um ramo doentio e insano, para estimar os efeitos nefastos de demasiada consanguinidade. Para Darwin, o sexo tinha tudo a ver com a exogamia, não obstante ter casado com a sua única prima direita, o modelo de virtude Emma Wedgewood, de quem teve 10 filhos.  
A resposta de Darwin gozava de dois grandes méri­tos, mas padecia do seu total desconhecimento acerca dos genes. E os dois méritos são, por um lado, que o vigor híbrido é vantajoso de imediato e, por outro, que os benefícios são focalizados num indivíduo. Isto signi­fica que é mais provável que a exogamia dê origem a crianças saudáveis que não morram na infância, logo que mais genes sobrevivam até à geração seguinte. Trata-se de uma explicação darwiniana agradável, com um significado mais abrangente ao qual voltaremos mais tarde. (Aqui, a selecção natural está a actuar sobre indivíduos e não sobre grupos.) O problema é que esta interpretação só explica a exogamia e não do sexo.

LANE, Nick - A Espiral da Vida. Lisboa: Gradiva: 2012. 524 p. ISBN 978-989-616-489-8

Este livro está disponível para requisição na Biblioteca da ESJS.

NICK LANE é bioquímico e foi contemplado com a primeira fellowship em investigação da Provost’s Venture no Departamento de Genética, Evolução e Ambiente  - University College London. Publica com regularidade em revistas científicas reconhecidas internacionalmente e dedica-se à divulgação científica nos vários meios de comunicação social. É frequentemente orador convidado em conferências internacionais. O seu livro anterior, Power, Sex, Suicide, foi nomeado para o Prémio Royal Society para livros de ciência em 2006 (prémio que o livro agora publicado venceu em 2010) e para o Prémio Jovem Autor Académico do Ano. Foi ainda eleito livro do ano pela The Economist.
(Texto da badana do livro)

DA CONCISÃO XVIII

Imagem daqui.
 
"A humildade em si mesma nada mais é do que a verdadeira consciência de nós mesmos tal como somos."
 
Anónimo do Século XIV, A Nuvem do Não-Saber, Lisboa, Assírio & Alvim, 2006
 
 
 

terça-feira, 2 de abril de 2013

O LÁPIS E O POEMA

Imagem daqui.
 
 
 
"Ana Luísa Amaral pegou no copo e verteu água lá para dentro até meio. «Alguém tem um lápis que me empreste?» Estávamos, eu e ela, na Escola Básica 2/3 de Rates, perto da Póvoa do Varzim. À nossa frente, dezenas de alunos convocados para um encontro com autores, incluído na programação das Correntes d'Escritas. De uma das filas do meio, levantou-se um rapazinho tímido, lápis na mão. Ana Luísa agradeceu, pegou no pequeno cilindro de grafite e madeira, mergulhando-o na água. «Estão a ver?», perguntou, copo levantado no ar. «Reparem na percepção que têm agora do lápis. Ele não perdeu nenhuma das suas carcterísticas, mas, devido ao fenómeno físico da refracção, parece maior. Parece outra coisa, parece diferente.» Onde está o copo com água até meio e lápis, leia-se poema e seu objecto. O poema não deve reflectir a realidade, deve refractá-la. Silenciosos, atentos, os miúdos perceberam a analogia, sem necessidade de grandes explicações. (...)

José Mário Silva, "O lápis na água", in Ler, nº 122, março de 2013, p. 33.