Antigo blogue do projeto novasoportunidades@biblioteca.esjs

Antigo blogue do projeto novasoportunidades@biblioteca.esjs, patrocinado pela Fundação Calouste Gulbenkian
Escola Secundária José Saramago - Mafra

sábado, 30 de março de 2013

PÁSCOA 2013

Caravaggio, Cena in Emmaus (1601)
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A concreta circularidade do espaço ocupado, o espanto feito deslumbramento e a serenidade confiante, a contrastante e inteligente distribuição da luz e da sombra, a singela alvura do branco vencendo a supremacia da cor e a centralidade luminosa da figura principal fazem pensar na cíclica concretização do milagre da Vida...
 
 

quinta-feira, 28 de março de 2013

DA SAUDADE IX

Marc Chagall, Paysage Vert (1949)
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“A saudade e o sebastianismo são as duas principais características da cultura portuguesa geralmente apontadas em textos que ensaiam uma definição do homem português (da alma portuguesa) ou, como alguns preferem dizer, da personalidade cultural portuguesa. Pensadores ligados ao movimento da filosofia portuguesa – de Sampaio Bruno, Cunha Seixas e Álvaro Ribeiro aos mais modernos como António Quadros ou Pinharanda Gomes – e mais isolados entre si como Jaime Cortesão, Magalhães Godinho, Cunha Leão, Agostinho da Silva, Eduardo Lourenço, António José Saraiva, Joel Serrão, Manuel Antunes, Orlando Ribeiro ou Jorge Dias, por exemplo, deram, e alguns dão ainda, importantes contributos para a definição do homem português e do carácter nacional. Interessa, porém, salientar, desde já, que, a nosso ver, não é tanto a veracidade dos traços apontados que nos importa (…), mas a forma como estes espelham uma imagem que de nós próprios fomos construindo ao longo de séculos. A Saudade e o sebastianismo, então, podendo ser ou não, do ponto de vista cultural, características que, de facto, nos individualizam, são, com certeza, imagens multisseculares com as quais nos identificamos, passíveis de condicionar, por sua vez, muitas das nossas manifestações culturais. A insensibilidade a este modo de perspectivar o problema tem sido, parece-nos, a principal razão das acesas polémicas que tais temas têm suscitado.
Comecemos pela Saudade, palavra de sentido dito intraduzível dada a complexidade afectiva que pressupõe, sentimento-ideia tido como peculiar do povo português, cuja constância e persistência na cultura portuguesa tem sido atestada por numerosos críticos, sobretudo como motivo de inspiração lírica e de reflexão filosófica. Assim, descobrem-na na poesia e na prosa portuguesas com uma incidência estatisticamente superior à de qualquer outra literatura, das cantigas de amor e de amigo ao Cancioneiro Geral, não esquecendo a Menina e Moça de Bernardim Ribeiro ou um Frei Agostinho da Cruz, de Sá de Miranda a Garrett, de António Nobre aos mais modernos, como Irene Lisboa, Rodrigues Miguéis ou David Mourão-Ferreira, e apontam-na como tema rico de implicações várias em textos filosóficos, principalmente portugueses e galegos, que sublinham a complexidade deste nó afectivo de difícil penetração. Lembrança, sentido de coração, paixão de alma, tristeza da separação, gosto romântico da solidão, sentimento ontológico puro, sentimento da totalidade, do desvanecido, ânsia do Ser, oscilação entre o aqui e o ali, cobiça do longe, procura de um abrigo, desejo de um bem perdido, etc., têm sido tópicos para uma definição da Saudade que ainda hoje permanece em aberto. A primeira referência irá sempre, porém, para D. Duarte que, no Leal Conselheiro, comparava a «suidade» com outras palavras afins (nojo, pesar, desprazer, avorrecimento) para concluir da sua especificidade e intraduzibilidade, e para Duarte Nunes de Leão que, seguindo os mesmos passos, tentava a primeira definição de Saudade - «Lembrança de alguma coisa com desejo dela».
Neste percurso vivencial da Saudade tem especial relevo a figura de Teixeira de Pascoaes, seu poeta por excelência. Em primeiro lugar, porque, para além de a nomear e invocar nos seus versos, a introjectou como força-motriz de todo o seu universo imaginário, modelando o clima inspirado dos seus poemas, a composição sui generis da sua linguagem, a tessitura formal, conceptual e temática da sua escrita; depois, porque, em termos filosóficos, a elevou à altura do sentimento mais perfeito do homem, fonte da sua espiritualidade, sentimento-ideia de força ascensional, aperfeiçoadora, que vai do mineral ao espiritual e que nele conhece a sua expressão mais sagrada, o seu contacto com Deus; por fim, porque, dado o contexto histórico-social do tempo, não só a defendeu como característica individualizadora do povo português, povo privilegiado, por isso mesmo, entre os outros povos, como, sobretudo, a defendeu como possível motor do ressurgimento nacional. Ao culto da Saudade, assim encarada, chamou Pascoaes simplesmente saudosismo. (…)”
Maria das Graças Moreira de Sá, “Duas palavras sobre a Saudade e o Saudosismo”, in As Duas Faces de Jano – Estudos de Cultura e Literatura Portuguesas, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2004, pp.45-47.

 

terça-feira, 26 de março de 2013

A PAIXÃO, de Almeida Faria

Almeida Faria (nasceu em Montemor-o-Novo, em 1943)
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22
João Carlos
Estou sentado e estudo esta coisa certa e definitiva: o preço como elemento essencial da compra e venda; a manhã aberta entra pela janela no ondear já quente das cortinas; penso em outra coisa oclusa e breve completamente diferente da que estudo; um largo prato de barro serve-me de cinzeiro, posto no chão; em propícia posição para meditação, medito nesta verdade de estar vivo e dentro duma vida que, contudo, me escapa, vera vontade, pressa de com alguém falar, ainda que sobre nada; entretanto vou, com insistência, sublinhando as palavras pretium certum justam verum e em dinheiro; (…) mas eis que oiço na rua, um pouco ao longe, para além do quintal que me afasta do mundo, uma voz arrastada, fina, frágil, que me envolve de paz: anda filho, vamos mas é para casa, anda mais depressa que a mãe não pode com o saco, anda filho, anda depressa, que o pai quer o almoço e não o tenho ainda, e não te pares assim constantemente no caminho, anda filho, anda depressa, dá-me a tua mãozinha senão o lobisomem leva-te, anda, vamos para casa; e os passos a par se afastam, pela calçada que sobe, cheia de som e eco da manhã que também, a custo, a pulso, sobe; com ela me volto, em solidão e difícil harmonia, para uma condição de estudo e de universidade; a universidade é um conjunto de edifícios novos, arrogantes, pretendendo-se belos, ali em pleno campo raso, verde durante grande parte do ano; ponta de Lisboa apontada ao futuro incerto, de dentro das suas vísceras velhas; velho gueto repressivo, carreirismo, inutilidade, autossuficiência vil, senil; (…) num primeiro plano lateral, a faculdade de direito, as suas formas cúbicas sobre o jardim deserto, a arcada rígida, baixos-relevos pobres na parede, com os eternos símbolos de cega justiça e barriguda família, os desenhos do átrio, humorístico-hieráticos, do Almada, com clássicos juristas desde Hammou-Rabi (2000 a.C.) até Heraclito e Pitágoras, Paulo e Agostinho, Rómulo e Remo, Apio Claudio e decênviros, os cinco da lei das citações, Gaio, Papiniano, Paulo, Ulpiano e Modestino, e por aí diante, até aos portugueses; entre esta faculdade e a reitoria (comprida a todo o equilíbrio do frontão com janelas, com míticas imagens laterais de Capricórnio e Câncer) salta a mancha de cores encarniçadas outrora vivas da cantina, de fachada de vidros, mas fechada pela polícia, tendo uma estrutura quase abstrata à ponta (…); finalmente, à extrema direita, no plano mais próximo, (…) a faculdade de letras, espelho da de direito, com figuras da dita cultura humanística, um tanto desesperadas, talvez porque sobressai D. Quixote e o Pessoa «menino de sua mãe» contrastando com a estátua de D. Pedro, o V deste nome, no pátio ajardinado; (…) agora está mais quente, está mesmo já calor; (…) do céu escorre o sono e uma sede sem tréguas nem remédio, sede da noite e do sonho (primeiro Osíris, o sol, é derrotado pela noite, Set, porém a esposa-vaca-lua, Ísis, vem procurar, pálida e triste, o seu cadáver frio e enfim o filho, Hórus, sol-nascente, vinga-se e vence, nasce, vive, esplende e uma vez mais o astro magno impera) (…).
Almeida Faria, A Paixão, Lisboa, Assírio & Alvim, 12ª edição (1ª edição em 1965), 2013, pp.102-105
 
Excerto do Prefácio, assinado por Óscar Lopes, em 12-4-1966:
“A palavra «poeta» na sua origem grega designa o fazedor ou produtor em oposição ao utente ou executante, ou seja, em literatura, o cantor, o recitador, narrador ou leitor. Originariamente, portanto, o poeta não se opõe ao prosador, até porque a prosa, como órgão literário (e até como órgão didático e doutrinário) é uma simples extensão, menos regular da poesia. Em alemão Dichter tanto designa um versificador como um novelista; uma Poética é, em sentido clássico, uma teoria e preceituário de arte literária: e a própria palavra prosa designa ainda na liturgia medieval um texto não sujeito a ritmo versificado mas sujeito a um ritmo musical, o da sequência prolongadora da palavra Aleluia. Ora, eu tenho agora pena de não existir em português uma palavra com a extensão semântica do Dichter germânico, porque era o que dava bem com Almeida Faria. A Paixão será um romance; mas é também um poema em ritmo livre, em ritmo tão livre que próprio leitor o determinará a seu modo, ad libitum do humor momentâneo, como o requer a própria pontuação aberta, toda em vírgula ou ponto e vírgula. (…)”
 

segunda-feira, 25 de março de 2013

VARIAÇÃO POÉTICA

Berthe Morisot, La Psyché ou Le Miroir, 1876
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Na luz do espelho está meu rosto,
assim brioso, assim delicado, assim firme.
Nele espreitam estes olhos curiosos
à procura do tão esperado sorriso.

A brisa veio ter comigo,
arrancando de mim
a escondida tristeza,
despertando, assim, meu coração.

Olhei para o espelho
e assim me vi
com o sorriso há muito esperado.
Ao vento da mudança agradeci.


Criação feita a partir do poema de Cecília Meireles, "Eu não tinha este rosto de hoje,"
da autoria da Aluna Filipa Reis, do 10º P, desta Escola.
 
 

quinta-feira, 21 de março de 2013

A POESIA NO SEU DIA


Imagem daqui.
 
 
A uma dama que lhe mandou pedir algumas obras suas

 
Senhora, se eu alcançasse,
No tempo que ler quereis,
Que a dita dos meus papéis
Pela minha se trocasse;
E por ver
Tudo o que posso escrever
Em mais breve relação,
Indo eu onde eles vão,
Por mim só quisésseis ler;

 
Depois de ver um cuidado
Tão contente de seu mal,
Veríeis o natural
Do que aqui vedes pintado;
Que o perfeito
Amor, de que sou sujeito,
Vereis áspero e cruel:
Aqui, com tinta e papel;
Em mim, com sangue no peito.

 
Que um contínuo imaginar
Naquilo que o Amor ordena,
É pena que, enfim, por pena
Se não pode declarar;
Que, se eu levo
Dentro na alma quanto devo
De trasladar em papéis,
Vede qual melhor lereis:
Se a mim, se aquilo que escrevo.

Luís de Camões, Lírica, Círculo de Leitores, 1980, pp.59-60.
 

SEMANA DA LEITURA 2013 (3)


Os alunos do Curso Profissional de Apoio à Infância (11.º Q2), acompanhados pela professora Ema da Silva, voltaram a surpreender os utilizadores da BE. Desta vez apresentaram uma pequena dramatização sobre os livros e a leitura, entre outros temas.

quarta-feira, 20 de março de 2013

PRIMAVERA


22
 
Primavera
 
A Flauta fala!
Agora cala.
A cantoria
Noite e Dia.
Rouxinol
Lá no vale,
Cotovia
Lá no Céu,
Tão Alegres, a acolher o Ano.
 
Menino,
Cheio de vida,

William Blake, Cantigas da Inocência e da Experiência, edição bilingue, Lisboa, Antígona, 2007.

SEMANA DA LEITURA 2013 (2)










Os alunos do 10.ºN, acompanhados pela professora Fátima Oliveira, leram  textos sobre a temática do mar, de autores da literatura portuguesa e outros escritos pelos alunos.

SEMANA DA LEITURA 2013 (1)


No âmbito da comemoração da Semana da Leitura, os alunos do 10.º T1 (Curso Profissional de Apoio à Gestão Desportiva) e do 11.º Q2 ( Curso Profissional de Apoio à Infância) e os professores António Santos e Ema da Silva leram textos, com acompanhamento musical, em português e inglês sobre o tema do mar.

terça-feira, 19 de março de 2013

XADREZ NA BIBLIOTECA (9)

Fotografia de grupo

Diretora da escola entrega prémios aos alunos

Discurso do professor Avelar Rosa sobre a importância do xadrez

 A PB agradeceu a todos os participantes

No dia 15 de março, pelas 10h, foram entregues certificados de participação a todos os alunos, uma pequena lembrança à única participante feminina, Mónica Dias, e prémios aos vencedores do torneio: João Araújo e Luís Ferreira (10.º C); Bruno Azevedo (11.º G) e João Torres (11.º E); Reydleon Paulo e Paulo Ferreira (12.º A).

segunda-feira, 18 de março de 2013

XADREZ NA BIBLIOTECA (8)




Realizou-se o III Torneio de Xadrez da ESJS com a participação de 15 alunos.

sábado, 16 de março de 2013

SABERES E SABORES

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“No domínio das ciências humanas, como a História, a Etnografia, a Sociologia e uma parte significativa da Geografia, são particularmente evidentes as profundas ligações entre os respectivos saberes e os sabores próprios dos hábitos alimentares das populações ao longo dos tempos e nas várias latitudes e longitudes. 
Uma rápida passagem sobre a multitude dos «cheiros» e «temperos», das hortaliças, dos cereais e de tudo o mais que consumimos entre os produtos vegetais, basta para evidenciar a grande e imediata ligação entre os saberes da Botânica, ou da Biologia Vegetal, como agora se diz, e os sabores dos nossos cozinhados. Poderia começar por evocar Garcia de Orta, contemporâneo das Descobertas e de Luís de Camões, e falar da sua contribuição na introdução das ervas aromáticas do oriente na cozinha regional do Alentejo. Grande botânico, este alentejano de Castelo de Vide é igualmente conhecido entre os mineralogistas pelas referências às pedras preciosas (gemas) que nos deixou no seu livro Colóquios dos Simples e Drogas e Cousas Medicinais da Índia, publicado em Goa, em 1563. Dentro desta ciência poderiam os seus cultores dissertar sobre a fisiologia e a bioquímica do mundo vegetal e das implicações de toda essa fenomenologia nas sensações que nos atingem o cérebro através da pituitária e das papilas gustativas. O raminho de hortelã escaldado nas «sopas da panela» e o aroma que, de imediato, se espalha no ar tem por base essências elaboradas pela respectiva planta e que são diferentes das dos orégãos, dos poejos, da hortelã da ribeira, do louro, dos cominhos e do alho de todos os dias. E a couve do caldo verde, o feijão da feijoada, a alface, o pepino e os pimentos das saladas, a cebola e o tomate das ceboladas e tomatadas, não são todos eles os produtos do «Reino Vegetal»? (…)
No que se refere à Zoologia, outro grande domínio do mundo biológico, são igualmente imediatas as associações que se podem fazer entre a gastronomia e o saber que aqui se cultiva. Nesta ciência o difícil é seleccionar os exemplos, tantas são as fantasias alimentares dos habitantes dos quatro cantos do mundo. Das (…) perfumadas e gostosas sardinhas na brasa e dos benefícios da respectiva gordura na regulação do colesterol, à caldeirada comida ali, a meio do Tejo e a saber a maresia, muitos são os pontos de conexão entre o «Reino Animal» e muito daquilo que comemos.”
A.M. Galopim de Carvalho, …Com Poejos e Outras Ervas, Lisboa, Âncora Editora, 2002, pp.45-46.


sexta-feira, 15 de março de 2013

MESA-REDONDA SOBRE MARIA GABRIELA LLANSOL




A 8 de março, decorreu na BE uma mesa-redonda sobre Maria Gabriela Llansol, com João Barrento e Etelvina Santos, professores especializados na obra llansoliana. 
Participaram alunos e professores da ESJS, uma representante das bibliotecas municipais do concelho de Mafra e elementos da comunidade educativa. Os oradores foram recebidos pela diretora da escola. 
O público mostrou muito interesse, fazendo perguntas e comentários pertinentes.

quarta-feira, 13 de março de 2013

LITERATURA DE CORDEL BRASILEIRA

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Está patente na Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, até ao dia 22 de junho, uma mostra sobre Literatura de Cordel Brasileira, com Folhetos de Arnaldo Saraiva.

"(...) o folheto foi e ainda é veículo de uma literatura fabulosa e única no mundo: uma literatura escrita mas sempre próxima da oralidade (e da realidade); uma literatura produzida e consumida sobretudo por quem não tem outra cultura para lá da oral e popular; uma literatura que tem da vida quotidiana e do mundo antigo ou recente uma visão às vezes crua, às vezes ingénua, às vezes heterodoxa, mas quase sempre expressiva e jocosa. Uma literatura, enfim, que ensina, anima e alegra gente com poucos motivos de alegria e de esperança, ou que pode ser a riqueza de quem não tem outra." (Texto de Arnaldo Saraiva)
 
A entrada é livre.
 
 

SE O SOL SE PÕE P'RA TE VER


Se o Sol se põe p’ra te ver
Se a luz reflete o teu olhar
A nuvem cresce ao teu redor
O teu amor vai voltar



À janela, espreito, à tua procura
Vejo o horizonte fugindo
A lua está fria e escura
O teu rosto refletindo

 
Procuro-te e não te encontro
Espero ver-te ao redor
Meu coração te procura
Espero encontrar teu amor



Tua voz doce e serena
Teu rosto belo, arrepios,
Tua pele tão morena
Lábios vermelhos e frios

 
Olho-te, o teu olhar é seguro
Que procuras com teu olhar?
O mesmo que eu procuro
Teu coração conquistar

 
A paixão é um pecado
A paixão é traiçoeira
O amor é doce quente
O sofrer é bebedeira

 
Onde estás, pergunto eu
Longe? Perto? Não sei…
Fugiste com o teu coração
Não pertences a ninguém.
Poema de Elvira Maria Lopes Henriques Mendes, antiga Aluna desta Escola


 

terça-feira, 12 de março de 2013

ULISSES

James Joyce (Dublin, 2 de fevereiro de 1882 — Zurique, 13 de janeiro de 1941)
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“O elegante mundo internacional compareceu en masse ao casamento de chevalier Jean Wyse de Neaulan, alto grão-mestre dos Floresteiros Nacionais Irlandeses, com a senhoria Abeta Conifer Pinheiro do Vale. Lady Silvestre Olmedo, a senhora Bárbara do Vidoeiro Amado, a senhora Pontal do Freixo, a senhora Azevinho Avelaneda, a senhorita Dafne Loureiro, a senhorita Doroteia Canabrava, a senhora Clyde Arboredo, a senhora Rowan Verdasco, a senhora Helena Vinívaga, a senhorita Virgínia Coleante, a senhorita Gládis Faia, a senhorita Olívia Jardim, a senhorita Branca Bordácer, a senhorita Maud Mógono, a senhorita Mira Murta, a senhorita Priscila Sabugueiro, a senhorita Melissa Pitamel, a senhorita Graça do Choupo, a senhorita O. Mimosa Sena, a senhorita Raquel Ramalho do Cedro, as senhoritas Lília e Viola Lírio, a senhorita Temuda Salgueiro, a senhorita Pequenita Limo-Aljofreira, a senhorita Maia Pilriteira, a senhora Gloriana Palma, a senhora Liana Floresta, a senhora Florabela Montenegro e a senhora Norma Sancarvalho Régis do Carvalhal enfeitaram a cerimónia com a sua presença. A noiva que foi levada ao altar por seu pai (…) ostentava-se esplendidamente encantadora numa criação executada em seda mercerizada verde, armada por uma anágua cinza crepuscular, capeada num amplo xaile esmeralda e arrematada com tríplices babados de franjas mais escuro-matizadas, o conjunto sendo realçado por entremeios e anquinhas bronze glande. As daminhas de honor (…) luziam vestidos muito atraentes do mesmo tom, num delicioso motif de rosa penugem incrustado nas pregas em listinhas e caprichosamente repetidos nos toucados verde-jade em forma de plumagem de garça coral pálido. O senhor Enrique Flor regeu o órgão com sua renomada competência e, ademais dos números prescritos para a missa nupcial, executou um novo e vibrante arranjo do Lenhador, Poupa Essa Árvore na condução do ofício. Em deixando a Igreja (…) o feliz par foi objecto de um álacre fogo-cruzado de avelãs, fagoeiros, folhas de louro, amentilhos de salgueiro, brotos de hera, bagas de azevinho, renovos de visco (…). O senhor e a senhora Wyse Conifer Neaulan gozarão de uma tranquila lua-de-mel na Floresta Negra.”
James Joyce, Ulisses, tradução brasileira de António Houaiss (com actualização ortográfica),
Lisboa, Difel, 1992, pp.245-246.


segunda-feira, 11 de março de 2013

SEM PALAVRAS VIII


Na Planície, Rão Kyao



XADREZ NA BIBLIOTECA (7)

Cartaz da autoria do  Professor Luís Amorim e alunos do 12.º S3 (2011)

13 de março (quarta-feira)

Início dos jogos: 8h30
 
Biblioteca 

Organização: Equipa da Biblioteca Escolar e Professor José Avelar Rosa.

sexta-feira, 8 de março de 2013

NO DIA INTERNACIONAL DA MULHER

Blimunda
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“Durante nove anos, Blimunda procurou Baltasar. Conheceu todos os caminhos do pó e da lama, a branda areia, a pedra aguda, tantas vezes a geada rangente e assassina, dois nevões de que só saiu viva porque ainda não queria morrer. Tisnou-se de sol como um ramo de árvore retirado do lume antes de lhe chegar a hora das cinzas, arregoou-se como um fruto estalado, foi espantalho no meio de searas, aparição entre os moradores das vilas, susto nos pequenos lugares e nos casais perdidos. Onde chegava, perguntava se tinham visto por ali um homem com estes e estes sinais, a mão esquerda de menos, e alto como um soldado da guarda real, barba toda e grisalha, mas se entretanto a rapou, é uma cara que não se esquece, pelo menos não a esqueci eu, e tanto pode ter vindo pelas estradas de toda a gente, ou pelos carreiros que atravessam os campos, como pode ter caído dos ares, num pássaro de ferro e vimes entrançados (…). Julgavam-na doida, mas, se ela se deixava ficar por ali uns tempos, viam-na tão sensata em todas as mais palavras e acções que duvidavam da primeira suspeita de pouco siso. Por fim já era conhecida de terra em terra, a pontos de não raro a preceder o nome de Voadora, por causa da estranha história que contava. Sentava-se às portas, a conversar com as mulheres do lugar, ouvia-lhes as lamentações, os ais, menos vezes as alegrias, por serem poucas, por as guardar quem as sentia, talvez porque nem sempre há a certeza se sentir o que se guarda, é só para não ficar desprovido de tudo. Por onde passava ficava um fermento de desassossego, os homens não reconheciam as suas mulheres, que subitamente se punham a olhar para eles, com pena de que não tivessem desaparecido, para enfim poderem procurá-los. (…)
Nove anos procurou Blimunda. Começou por contar as estações, depois perdeu-lhes o sentido. Nos primeiros tempos calculava as léguas que andava por dia, quatro, cinco, às vezes seis, mas depois confundiram-se-lhe os números, não tardou que o espaço e o tempo deixassem de ter significado, tudo se media em manhã, tarde, noite, chuva, soalheira, granizo, névoa e nevoeiro, caminho bom, caminho mau, encosta de subir, encosta de descer, planície, montanha, praia do mar, ribeira de rios, e rostos, milhares e milhares de rostos, rostos sem número que os dissesse (…).
Milhares de léguas andou Blimunda, quase sempre descalça. A sola dos seus pés tornou-se espessa, fendida como uma cortiça. Portugal inteiro esteve debaixo destes passos, algumas vezes atravessou a raia de Espanha porque não via no chão qualquer risco a separar a terra de lá da terra de cá, só ouvia falar outra língua, e voltava para trás. (…)
Encontrou-o. Seis vezes passara por Lisboa, esta era a sétima. (…)”
José Saramago, Memorial do Convento, Lisboa, Caminho, 2ª edição, 1983, pp.353-356
 

8 de março de 2013: DIA INTERNACIONAL DA MULHER

Imagem: Leandro Lamas
Pinzelladas al món

NOVIDADE NA BE


Nature é uma revista científica, semanal, publicada em Inglês. Especializada nas áreas mais recentes da ciência - da biotecnologia até à investigação espacial. As suas secções incluem as últimas descobertas da ciência internacional e originais artigos de investigação.

Esta conceituada revista está disponível para leitura na estante de periódicos.

quinta-feira, 7 de março de 2013

DA CONCISÃO XVII

 
Champ de blé aux corbeaux, Vincent Van Gogh (1890)
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SOROR MARIANA - BEJA
 
Cortaram os trigos. Agora
A minha solidão vê-se melhor

Sophia de Mello Breyner Andresen, Signo, Lisboa, Editorial Presença, 1994, p.66
 
 
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CINCO BOAS RAZÕES PARA LER LLANSOL

1. Para perceber que a dimensão «gregária» (social), ou a psicológica, que dominam hoje as nossas vidas, nem sempre são as mais importantes, e que a «literatura» (que identificamos quase sempre com o romance realista e social) não existe, ou não tem lugar hoje, se for máquina de produzir narrativas sempre iguais e derrames psicológicos esgotados.

2. Para compreender como nós, humanos, não somos o centro de uma cadeia hierárquica, mas um elo na «grande cadeia do Ser» (já Shaskespeare ou Dante têm de ser lidos a esta luz). E que temos a enorme responsabilidade de assumir um contrato com o Vivo (que vem de Espinosa e deveria ir dar hoje ao protocolo de Kyoto e às políticas do ambiente!) . Isto é actualíssimo, num momento em que o planeta está claramente ameaçado! E actualíssima é também a pergunta, daí derivada: o que é o humano? (depois do fim de todos os humanismos), pergunta central em Llansol. Quem chega a encontrar a resposta, lendo-a e insistindo na leitura, muda de vida.

3. Para entender que o mundo não é o que ingenuamente julgamos que ele é, mas existe sempre «em dobra»; que ele é o «desconhecido que nos acompanha» e produz o novo que transforma; que há o visível e o invisível, e que este não é metafísica, mas resulta de olhar o concreto e sentir a potência de um corpo: estamos perante um hiper-realismo da matéria, do carbono, da energia vital de onde tudo nasce! É este o combustível da linguagem de Llansol, são estes os temas dos seus livros, e não as estafadas histórias das vidinhas pessoais ou colectivas.

4. Para termos o prazer de reaprender a ler, e perceber o que é ser «legente» e não simples leitor. Porque esta aprendizagem pode ser um prazer, tal como escrever o era para Llansol, uma escritora cuja Obra nasceu da superação do medo, do poder de decisão próprio, de uma escolha da via do isolamento e da «despossessão» (que criou uma comunidade na diáspora, a única possível para ela, que não se confunde com nenhuma espécie de seita nem partido, e que hoje é grande, apesar de não parecer). E isto inclui a despossessão da própria noção de «autor», que Llansol rejeitava, porque nela não há nem posse, nem autoridade.
Por isso, toda a Obra coloca uma exigência única e dupla : reaprender uma estética (do fulgor da palavra e da língua sem impostura) e aceitar uma ética (não de grupos, não social, mas a da liberdade de consciência , a dos esquecidos da História na «geografia de rebeldes» da Europa que os seus livros percorrem desde a Idade Média, a dos inteiros e intensos): é esta a etistética ou a sensualética de Llansol.
 
5. Finalmente, e de um ponto de vista mais exterior: porque é uma escritora que escreveu, só escreveu, escreveu sempre intensamente , como muito poucos: «escrever é o duplo de viver» (e vice-versa: a escrita é uma pulsão vital). Isso está hoje patente no imenso espólio que deixou, manancial para muitos mais livros por vir... e que virão brevemente.

JOÃO BARRENTO
CINCO BOAS RAZÕES PARA LER LLANSOL
 

quarta-feira, 6 de março de 2013

FESTIVAL LITERÁRIO DE MACAU

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Entre os dias 10 e 16 de março de 2013 decorrerá a segunda edição da Rota das Letras - Festival Literário de Macau, reunindo, no mesmo evento, o português e o chinês, e contando com a participação de escritores, editores, tradutores, jornalistas, músicos, cineastas e artistas plásticos.
 
Todas as informações poderão ser encontradas aqui.

JOANA VASCONCELOS NO PALÁCIO NACIONAL DA AJUDA

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A partir do dia 22 de março de 2013, estará patente, no Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa, a exposição de Joana Vasconcelos que pôde ser visitada em Paris, no Palácio de Versalhes, em 2012.
 
Fonte: Diário de Notícias

terça-feira, 5 de março de 2013

D. LUÍS DA CUNHA

D. Luís da Cunha, por João Maria Caggiani (1842)
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Por ocasião da recente edição crítica do Testamento Político ou Carta de conselhos ao Senhor D. José sendo Príncipe,  da responsabilidade de Abílio Diniz Silva, com a chancela da Biblioteca Nacional de Portugal, apresentamos um excerto da mencionada carta, da autoria de D. Luís da Cunha.

Este diplomata português, que nasceu em Lisboa em 1662, vindo a falecer em Paris, em 1749, formou-se em Cânones pela Universidade de Coimbra e foi um reconhecido homem do seu tempo, desempenhando uma importante missão fora de portas. Citando Abílio Diniz Silva, D. Luís da Cunha foi um embaixador português que "desde 1697 [viveu] nas Cortes mais ilustradas da Europa (Londres, Haia, Hanôver, Madrid, Paris, Bruxelas)". (p. 32)

Terá sido no ano de 1742 que "D. Luís da Cunha sentiu a necessidade, ou até o dever (...), de redigir uma Carta de Conselhos ao Príncipe D. José, chamando a atenção do futuro rei para os graves problemas que se punham a Portugal, e para as urgentes e necessárias medidas de os resolver. Dever, porque tinha consciência da responsabilidade que lhe cabia por ser o mais antigo ministro em exercício, e pelo prestígio que lhe dava a sua longa carreira diplomática, durante a qual observou com lucidez os problemas dos países europeus que conheceu, e reflectiu nas soluções que neles encontrou para a resolução das dificuldades de Portugal. Soluções que nalguns casos ele sabia serem demasiado ousadas, contrariando interesses e ideias estabelecidas, e que pela sua contundência transformaram o Testamento num importante libelo reformador."(p. 28)



“(…) O que logo salta aos olhos é que Portugal não tem, nem frutos nem géneros, para se permutarem com os que nos entram de fora, não só quanto à qualidade, mas também quanto à quantidade e variedade. E para prova do que digo, não falarei nos géneros da desigualdade do comércio que temos com Castela, em prejuízo de Portugal, porque de todos é bem sabida, estando à porta; mas ajunto a lista dos frutos e géneros que os estrangeiros tiram de Portugal, e o que nele introduzem, como por exemplo:
Os Franceses tiram de Portugal, couros em cabelo, pau do Brasil, laranjas, limões, azeite, sumagre, marfim, lãs, amêndoas, figos, passas, peixe salgado, presuntos, óleo de copaíba, salsaparrilha, azeite de baleia, vinhos de Portugal, da Madeira, sabão de todas as castas, melaço, açúcar, tabaco do Brasil, casquinha, cravo do Maranhão, sebo, cacau, baunilha e paus para tintas.
É de reparar que os Franceses sempre foram aumentando os direitos da entrada dos ditos frutos e mercadorias, desde o ano de 1664, sem que usássemos da represália, como seria justo, levantando-lhes também à proporção os direitos da entrada dos que metem em Portugal, o que lhes seria mais sensível, porque são em muito maior quantidade e de melhor qualidade, a saber: em primeiro lugar, de Paris uma droga a que chamam moda, que vai por toda a Europa, e segundo diz o marechal de Vauban (…) é um dos melhores ramos do comércio de França.
Mandam de Paris, estofos de lã, e barbilhos da fábrica de Paris, luvas de castor e de meio castor, e outras, bastantes chapéus, cabeleiras, boldriés lisos e bordados em ouro e prata, leques de todas sortes, pérolas, sinais, espadins de prata e de cobre, dourados e prateados, botões de cobre dourados e prateados, e em cor, caixas de prata e douradas, algumas de ouro, e de tartaruga, volantes com ouro e prata lavrados, e de todas as cores, castiçais de cobre prateados, jarros, bacias, e outras mais coisas desta natureza, sapatos de homem e de mulher, (…) palatinas de várias sortes, rendas de seda crua, brancas e negras, fivelas de prata, de metal, e de pedras falsas, brincos e girândolas de pedras falsas, (…) véstias bordadas em ouro e prata, meias de seda e bordadas, fitas de ouro e prata da fábrica de Paris, e alguns panos de linho para camisas.
De Lião se manda toda a sorte de primaveras, nobrezas, estofos de ouro e prata, fio de ouro e prata, galões de ouro e prata, abotoaduras do mesmo, boldriés de seda, meias de seda, fitas de ouro e prata, lavradas e lisas. De Ruão, lenços de algodão, várias sortes de estofos do mesmo, panos para vestidos, águas ardentes (ainda que a entrada seja proibida), couros de vitela, calções e luvas de carneira e camurça, vinagres de cidra, caixas de tartaruga, de corno, e óculos. De Saint-Étienne várias sortes de estofos de linho, riscados e lisos. De Amiens, barreganas, camelões, estamenhas e outra sorte de fazendas de lã, e barbilho. (…) De Morlaix e Nantes, bretanhas, esguiões, papel pardo e velas de sebo. Da Flandres francesa, cambraias lisas e lavradas, alguns guardanapos, toalhas e rendas de linhas. (…)
Os Ingleses tiram de Portugal vinhos em grande quantidade, azeite moderadamente, couros da Baía, pau do Brasil, laranjas (…).
Mandam para Portugal panos, estamenhas, droguetes, sarjas, sempiternas, baetas, meias de seda e de lã, chapéus (…) e outras mais coisas.
Os Holandeses tiram de Portugal quase o mesmo que os Ingleses (…).
Metem em Portugal, meias grossas de lã e de fio, panos de Leyde e camelotes, sarjas, veludos, (…) e outras coisas mais.
Pelo que toca ao que sai de Portugal para as nações do Norte, e estas metem em Portugal, não vale a pena de entrar nesta individuação, porque o que elas tiram é muito pouco, e o que metem é por mãos dos Holandeses, (…) e são estes os que fazem o maior ganho, pelas comissões que se lhes mandam.
A respeito do que os Italianos tiram de Portugal, não estou cabalmente instruído, só sei que já foi maior a quantidade dos tabacos e açúcar que sacavam, e que navegam para Portugal muitos veludos, damascos de Génova, outros géneros de sedas, muito papel, e vidros.
À vista pois do referido, se pode fazer um cálculo dos poucos efeitos que temos para permutar com os estrangeiros, e que o excesso lho devemos pagar em dinheiro, o que mais facilmente se pode saber, se se mandar fazer um balanço nas alfândegas, porque dele constará o que sai e o que entra. Mas não posso deixar de dizer que nos direitos de entrada que os estrangeiros pagam, há um grande abuso, porque sobre serem neles favorecidos conforme as ordens de S. Majestade, os que têm na alfândega as suas fazendas, se acordam com os oficiais para lhas avaliarem em menos de metade, o que tenho por confissão dos mesmos mercadores que negoceiam em Portugal. (…)
Estas são as minhas ideias a respeito do sobredito; mas a principal seria examinar quais são as fazendas estrangeiras que poderíamos proibir por totalmente inúteis, as quais podíamos nós mesmos fabricar, para delas não necessitarmos, e quais poderíamos navegar nos nossos navios, tirando-as em direitura dos lugares onde as vão buscar os Holandeses para as mandarem para Portugal.”
Testamento Político de D. Luís da Cunha ou Carta de conselhos ao Senhor D. José sendo Príncipe, introdução, estudo e edição crítica de Abílio Diniz Silva, Lisboa, Biblioteca Nacional de Portugal, 2013, pp.122-125.